sábado, 16 de dezembro de 2023

 


Tomar consciência da nossa finitude

Soube da morte do João Carlos e fiquei a pensar no que é a vida e a morte. O início da vida, o seu curso e o final, na maior parte das vezes inesperado e doloroso.

Bateu-me forte o facto de já ter presenciado o desaparecimento duma série de pessoas da minha geração. O Xiné, o João Pedro, o Falcão, o Sapina, o Tó-Pê, a Alice, o João Carlos e mais alguns que não tenho presente na memória. O pensamento leva-nos para a triste conclusão de que somos finitos, que haverá um dia que deixaremos de existir, que mais ninguém irá falar connosco, partilhar uma refeição, connosco viajar, rir, chorar, passear. O que fazer com as nossas roupas, os nossos pertences pessoais, os nossos sonhos, os nossos projetos? O que farão com os meus sapatos favoritos? Quem irá conduzir a nossa viatura e utilizar o nosso computador? Será para sempre ou temporária, essa nossa ausência? Queremos que seja temporária porque não concebemos, nem conseguimos compreender, ser para todo o sempre.

Tudo irá cair num vazio difícil de imaginarmos enquanto cá estamos.

Na nossa cabeça e enquanto cá estamos fisicamente, aproveitando para dizer que não acredito em qualquer outra forma de existência, achamos que nunca iremos desaparecer, que nunca deixaremos de sentir o ar, o calor, o frio, as pessoas que nos rodeiam. Não conseguimos imaginar que um dia a coisa se finda, que iremos morrer e seremos eliminados das ruas da nossa aldeia, que seremos enterrados ou cremados. Negamos essa possibilidade face à sua difícil compreensão. Não conseguimos conceber, compreender, imaginar, uma ausência de futuro. Não conseguimos imaginar o que será a nossa não existência para todo o sempre.

Foi-nos sendo dito, ao longo da nossa vida por pessoas que acreditam ter uma vida para além da morte, que iremos para um outro local onde se dará continuidade à nossa existência terrena, numa crença elaborada para não darmos em loucos, para haver uma lógica existencial e assegurarmos que esta sequência lógica faz sentido, que depois desta “fase terrena” haverá outra melhor, num cenário idílico propício à continuação da nossa vida. Também é certo que esse cenário é criado para se poderem vender pedaços de céu, para que pessoas tenham poder sobre outras pessoas e para que se possa, numa lógica fatal de egos humanos, exercer poder sobre outrem e assegurar a sua submissão através do medo e da culpa. Essa é a lógica das religiões, sejam elas quais forem. Homens a exercer poder sobre os demais, fazendo-nos crer que o Homem foi criado por um Deus omnipresente, omnipotente e omnisciente, e não que esse Deus, castigador e perdoador, foi criado por Homens à sua imagem, num fato por medida em função do tempo, da geografia e das culturas locais.

A idade torna-nos permeáveis a estas questões, já que, ao ver partir pessoas na nossa geração, sentimos que mais tarde ou mais cedo, invariavelmente, chegará a nossa hora para todo o sempre, sem que possamos nada fazer nem decidir. Isso é, realmente, de difícil entendimento: Desaparecer para todo o sempre. Apenas e somente, puf. Desaparecemos da mesma forma que chegámos. Apenas e só algumas emoções e obras deixadas, sem nada connosco conseguirmos levar, porque de nada iremos usufruir após o suspiro final.

Boa Vida a todos e usufruamos enquanto pudermos, deixando as melhores emoções possíveis e as melhores obras possíveis, para que os seguintes tenham as melhores emoções possíveis, enquanto cá estão.

Boas Festas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário